Uma borboleta posou na minha calça. Eram tão leves os movimentos que fazia com as asas, que nem parecia se incomodar com a indelicadeza do movimento do ônibus. Mal sabia ela, que estava descansando no colo de alguém, que poderia esmagá-la com um sopro, sem que fosse isso seu desejo. O barulho não parecia incomodá-la, enquanto lá estava eu, me atormentando com o barulho exagerado das batidas dos bancos vazios. Pra falar a verdade, nem me dei conta do momento em que se acolheu no meu colo. Não. Não foi apenas por ser ela, o ser mais sutíl e leve. Foi a falta de sintonia entre o que todos podem ver e entre o que ninguém pode. Meu corpo anda meio desligado da alma, e então, os detalhes acabam se tornando invisíveis. Não olho para o céu com tanta frequência, porque meu corpo se recusa a deixar de correr e a faltar os compromissos, para perder tempo olhando um punhado de azul com manchas brancas. Quando a borboleta chegou, foi assim. Foi quase uma guerra. O corpo logo fez questão de espantar aquele inseto e até chegou a movimentar agressivamente a perna, para que a borboleta saísse depressa. Mas lá continuou ela, movimentado as asas, como quem encontrou a tranquilidade. E eu também acabei encontrando. Fiquei quietinha, quase tentando parar o ônibus com o poder da mente. Olhei para o céu por alguns minutos, para que ele não pensasse que o havia esquecido por causa da borboleta. E logo, encostei a cabeça no banco, tirei uma foto da borboleta e percebi o vento acelerando a frequência com que movimentava as asas. Para você pode ser exagero, e pra falar a verdade, pouco me importo...Mas quando a borboleta bateu as asas, um pouco mais forte e saiu voando pela janela, eu sentí a vida. Aí me veio algo na cabeça, que pouco tem a ver com borboleta ou que muito tem a ver com ela. Algo do tipo: Nascer e morrer, é uma obrigação. Viver, não! Viver é uma escolha que nem todos que nascem e morrem acabam escolhendo. Viver, no final, é fácil demais pra uma raça que se programa o tempo inteiro para o difícil. A rotina é difícil. E quando é que vamos viver?